Brasil das oportunidades perdidas

Data: 10/12/2018
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Artigo publicado originalmente no jornal O Globo.

No século XXI, produção e conservação são grandes aliadas do mundo dos negócios.

Muito se tem lamentado a desistência do Brasil de ser a sede da Conferência das Partes do Clima (Cop 25) em 2019. Porém, a indignação deveria ser canalizada para a sucessão de perdas de oportunidades pela falta de compreensão do nosso potencial na economia de baixo carbono. Como dizia Roberto Campos, o “Brasil nunca perde uma oportunidade de perder oportunidades”.

A questão climática vai além deste evento e é maior do que ideologias pessoais. Mesmo que não se acredite na interferência humana no aquecimento global, é inegável que o mundo ruma para uma economia mais limpa. Para essa nova economia estão migrando investimentos, especialmente os que estão relacionados à inovação tecnológica nos mais diversos setores produtivos. Muitas vezes a opção de desacreditar nas mudanças climáticas se dá por questões econômicas, reservas de mercado e lobbies de setores, como é o caso do carvão, financiador importante da campanha eleitoral de Donald Trump, insumo fundamental nas economias da China e da Índia. Entretanto, é preciso frisar: esse não é o nosso caso.

No Brasil, temos recursos naturais em abundância para geração de energia solar, eólica e de biomassa, fontes que têm seus custos cada vez mais baixos. É no nosso país que estão a maior floresta tropical e a maior biodiversidade do mundo. Se antes as florestas foram ocupadas ou desmatadas por conta da expansão agrícola, no futuro, que é cada vez mais presente, a floresta será preservada pelos próprios moradores locais, a partir de um planejamento estratégico inteligente de desenvolvimento local e manejo. Hoje, essas ações são feitas em pequena escala, mas poderão ter enorme valor econômico, ser fonte de emprego e renda não só para a região como para todo o país, a partir das cadeias de valor geradas pela produção local.

É preciso que se compreenda que no século XXI produção e conservação são grandes aliadas do mundo dos negócios. Além disso, nossos principais produtos agrícolas sofrerão cada vez mais restrições comerciais, caso a questão climática seja negligenciada. Em todos os setores produtivos cresce a exigência de relatórios com informação sobre as emissões de carbono para evidenciar riscos para acionistas e investidores. Tanto isso é fato, que, atualmente, 25% das emissões globais de carbono já estão associadas a algum mecanismo de precificação. O mundo econômico já opera nessa nova realidade.

Sem o entendimento sobre a importância estratégica das mudanças climáticas para o Brasil, a realização ou não da COP 25 em nosso país se torna mesmo irrelevante. Ainda que nenhum brasileiro acreditasse na interferência humana no aquecimento global, deveríamos aproveitar a enorme oportunidade econômica que a questão nos traz dentro da nova geopolítica. Só temos a ganhar.

O Brasil, com sua matriz energética limpa, seu programa de etanol, sua rica biodiversidade, e suas florestas, tem muito oferecer ao mundo. O protagonismo brasileiro – que já é reconhecido internacionalmente entre os especialistas, autoridades e empresas envolvidas no tema – precisa também ser reconhecido em território nacional, de forma ampla e acessível por toda a sociedade, autoridades e outras empresas que não estejam diretamente ligadas ao tema, mas possam ser beneficiadas indiretamente.

Só assim será possível garantir a expansão de políticas públicas que permitam ampliar ainda mais os negócios, será possível ganhar escala e nossas empresas poderão ter plenas condições de atuação usando o máximo de seu potencial, gerando riquezas, tributos e empregos para o Brasil.

Marina Grossi é presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável.

Suzana Khan é presidente do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas.