Como os diferentes elos de algumas cadeias mais expostas a este problema tem buscado desacoplar o desmatamento de suas cadeias de fornecimento.
A primeira delas diz respeito à não relação entre os efeitos de Jevons (aumento de produtividade com aumento de área) e de Borlaug (aumento de produtividade sem aumento da área, ou seja, com economia de área), e o perfil de produtores rurais (Agricultura Familiar e Não-Familiar). Nas mesorregiões que concentram 80% da produção (alta eficiência produtiva), há a predominância do efeito Jevons. Em outros termos, existe o aumento de produtividade, mas com a expansão da produção sobre outras áreas. No entanto, neste estudo, não foi possível identificar se a expansão foi sobre áreas de vegetação nativa, pastagens degradadas ou substituição de culturas.
A segunda constatação está relacionada ao efeito de realocação de algumas culturas no território, especialmente as 'staple crops'. Há uma tendência de que áreas com culturas que apresentam demanda estável sejam transferidas para locais cujo aumento da produção seja mais rentável. Um exemplo é o feijão, que se deslocou do Sul do país para o Centro-Oeste, onde a produtividade é maior, tornando o produto mais competitivo. Ao contrário da soja, que possui demanda infinita, e na qual se observa o efeito Jevons.
A terceira, e última diz respeito à pecuária bovina, que possui uma dinâmica de expansão bem particular. Ela se intensifica apenas em áreas consolidadas, mas se extensifica em regiões de fronteira. O efeito Jevons não é observado porque a pecuária tem essa característica de extensificação sem o aumento da produtividade. O efeito estável é observado porque ainda há terra para a expansão. No entanto, a tendência é que com o passar do tempo o efeito Borlaug seja observado.
Clique para ver maisNo caso da soja, o efeito Jevons, que envolve aumento da produtividade com a expansão das áreas, ocorreu sobre a maior parte do país, sobretudo nas áreas de fronteira entre Cerrado e Amazônia, e nas regiões Centro-Sul.
No caso do café, o efeito Bourlag é mais presente. Mas, ao considerarmos as mesorregiões mais produtoras as dinâmicas se misturam, com expansão nas porções do sul mineiro, mas com economia de áreas nas regiões entre o oeste mineiro e o Espírito Santo.
Na bovinocultura, a dinâmica entre produtividade e expansão se manteve estável na maior parte do Brasil. Contudo, vale destacar o efeito inesperado, pois em áreas já consolidadas e com maior intensificação, ocorreu a economia de terras (efeito Bourlag). Enquanto nas regiões de fronteira, onde a pecuária é extensiva, houve a expansão das áreas (efeito Jevons).
Os elos finais das cadeias, representados pelos processadores e distribuidores, têm maior visibilidade por sua associação mais direta com o consumidor, especialmente os que possuem relações comerciais com o mercado europeu, considerado mais exigente no cumprimento dos quesitos socioambientais.
As regulações dos mercados internacionais são importantes para mover os elos das cadeias a gerar a transformação no campo, contudo estas regulações não são suficientes porque o mercado doméstico, especialmente para a carne bovina, é grande.
A entrada dos mercados asiáticos, especialmente a China, é fundamental para motivar a introdução de novas regras de transação devido aos grandes volumes de soja e carne consumidos por este país.
O fator que mais contribui com a dificuldade de multiplicar as boas experiências reside na baixa articulação dos diversos elos das cadeias, visando a integração e difusão das ações que podem ser postas em vários níveis, além do controle do desmatamento, como por exemplo, incentivos para adoção de boas práticas redutoras de carbono e metano, a restauração de pastagens degradadas, formação de arranjos locais para reinserção de produtores bloqueados, etc.
Clique para ver maisNo contexto do surgimento dos acordos vigentes hoje, como a Moratória da Soja na Amazônia e o Protocolo Verde de Grãos do Pará, bem como o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) da Carne e o chamado Compromisso Público da Carne, foram as organizações da sociedade civil e os agentes públicos os protagonistas.
As indústrias processadoras têm alcançado um patamar de destaque, tanto na implementação de sistemas de monitoramento mais inteligentes quanto no trabalho de engajamento/articulação com seus fornecedores diretos. Isso tem refletido em maior envolvimento e participação de outros elos como as varejistas e instituições financeiras/bancos em prol do combate ao desmatamento ilegal. Contudo, muito trabalho ainda precisa ser feito, especialmente no caso dos fornecedores indiretos.
Olhando para oportunidades e caminhos futuros, a agricultura regenerativa parece ser a grande aposta para introduzir práticas sustentáveis que conseguem, a um só tempo, aumentar a produtividade, diminuir os custos da produção, promover o reflorestamento e a restauração da paisagem, diminuir a emissão de carbono e, ainda, estimular a adoção de boas práticas sociais e agrícolas.
O caminho da agricultura regenerativa é um dos caminhos trilhado pela cadeia do café, pois estimula a adoção de boas práticas sociais e agrícolas, respondendo assim tanto às pressões de mercado para a produção de alimentos de forma sustentável, atuando também como uma estratégia de mitigação das mudanças climáticas.
Clique para ver maisUm cenário que pretende avanços contundentes, o que é necessário e urgente de agora em diante, pressupõe, não apenas a articulação do Estado com o setor privado, mas a união de esforços internamente nestes setores. Isto é, as ações devem superar a barreira privada de cada empresa e serem expandidas para ações setoriais que articulem diferentes elos e diferentes cadeias; assim como as ações estatais devem ser bem coordenadas entre os níveis federativos.
A ausência de uma unidade no que se refere aos conceitos e definições, e mesmo nas regulações postas, que envolvem as questões do desmatamento, são aspectos que impactam na comunicação e tendem a fragmentar a atuação dos elos dessas cadeias. Por outro lado, não há informação concreta e suficiente sobre os benefícios da adoção de práticas mais sustentáveis, como o uso de insumos agrícolas de origem biológica ou a implementação de sistemas ILPF, por exemplo, que reduziriam significativamente os custos de produção. Embora a tecnologia e a inovação estejam presentes no mercado, visando sobretudo o crescimento da produtividade, o produtor rural não vê alternativas, hoje, que aumente sua rentabilidade, senão expandir sua produção para novas áreas.
Gibbs et al. (2015), Gollnow et al. (2018) e Virah-Sawmy (2019) destacam que para além dos grãos, as ações voltadas para o desmatamento zero deveriam ir além de um único produto. Os autores citam, por exemplo, a necessidade de ampliar o monitoramento para a produção de carne. Há uma dinâmica de complexidade e interdependência envolvendo setores (soja e pecuária) e regiões (Cerrado e Amazônia) (Sawyer, 2009; Silva & Oliveira, 2018; Carvalho et al., 2019; Lima et al., 2019; Marques et al., 2019; Waroux et al., 2019; Stabile et al., 2020). Com a expansão do cultivo, outras atividades agropecuárias, como a pecuária, seriam deslocadas para a Amazônia gerando os chamados efeitos indiretos sobre o meio ambiente e grupos locais. Além de ambíguo, o impacto territorial das grandes lavouras tende a ser bastante heterogêneo (Favareto et al., 2022). Deste modo, diferentes cadeias e elos estariam conectadas em ações em prol de um mesmo objetivo, o que além de potencializar os esforços empenhados, pode ter impactos na otimização de custos do processo de monitoramento, que é complexo e bastante oneroso.