Clima e biodiversidade, enfim, dão as mãos na COP26

Durante duas semanas, as atenções do mundo se voltaram para Glasgow, Escócia, que sediou a 26ª Conferência sobre Mudança do Clima da ONU, ou COP26. A cúpula trouxe sinalizações importantes dos países em relação a uma maior ambição nos compromissos para se evitar um aumento da temperatura global acima de 1,5ºC em relação à era pré-industrial, objetivo do Acordo de Paris. E, pela primeira vez desde que as COPs são realizadas, os eixos do clima e da biodiversidade deram as mãos, em acordos importantes.

Um dos mais notáveis nessa direção foi a Declaração de Florestas, assinada por mais de 100 países, que coloca a biodiversidade como elemento central na solução climática: manter a floresta em pé passa a ser o melhor caminho para neutralizar as emissões. No pacto, que abrange cerca de 85% das florestas do mundo, países como Brasil, Rússia, China e Estados Unidos prometeram acabar com o desmatamento até 2030. Foi um dos primeiros grandes acordos a emergir da COP26 e pretende mobilizar um montante significativo de recursos: os governos comprometeram US$12 bilhões e as empresas privadas, mais US$ 7 bilhões para proteger e restaurar as florestas, incluindo US$ 1,7 bilhão para os povos indígenas. Mais de 30 instituições financeiras também prometeram parar de investir em empresas responsáveis ​​pelo desmatamento.

De acordo com as Nações Unidas, mais de 1,6 bilhão de pessoas no mundo dependem das florestas para sobreviver, sendo que os povos indígenas são os guardiães de pelo menos 36% das florestas ainda intactas – não por acaso, esta COP26 foi recordista na participação dos povos nativos, que discursaram com fervor nas plenárias e participaram de encontros relevantes. 

Como país mais biodiverso do mundo, o Brasil tem enorme janela de oportunidades com o acordo, mas para isso precisamos agir de modo enérgico no combate ao desmatamento dos nossos biomas, especialmente a Amazônia, que é o nosso elefante da sala. Ele responde por 44% das emissões brasileiras de gases de efeito estufa, sendo que 90% deste total são provenientes de atividades ilegais. Portanto, seu fim representa muitos ganhos ao país e aos negócios brasileiros.

A floresta amazônica acomoda mais da metade da biodiversidade do planeta. Ela ocupa 60% do território brasileiro; nela estão presentes 30 milhões de espécies de animais e 29 milhões de pessoas, sendo que 72% delas vivem em cidades. Em pé, ela cumpre seu papel primordial de alimentar as chuvas em outras outras regiões do país, por meio dos chamados rios voadores, permitindo que a nossa agricultura seja tão forte e que cidades como São Paulo e Rio de Janeiro continuem gerando empregos e renda. A Amazônia é essencial para a economia brasileira e a estancada do desmatamento representa muitos ganhos ao país e aos negócios, especialmente quando se olham os horizontes da bioeconomia com base nos ativos florestais – que podem gerar emprego e renda em segmentos como fármacos, cosméticos, alimentos e serviços ecossistêmicos, entre outros. 

Nesta COP26, outro tema bastante discutido foi o potencial das Soluções Baseadas na Natureza (SBN) como complementares a estratégias de redução de gases de efeito estufa. O conceito, cunhado pela União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês), inclui abordagens para a restauração e conservação de ecossistemas, infraestrutura natural e adaptação climática, de forma integrada aos ecossistemas. 

Também aqui o potencial do Brasil de fomentar a economia é gigantesco: estudo do CEBDS aponta que, se esses instrumentos forem viabilizados, poderão gerar até US $17 bilhões até 2030, pois o país, representa, sozinho, 20% do potencial global não explorado em SBN combinadas com tecnologias para redução das emissões de gases de efeito estufa.  Em torno de 63% do potencial do Brasil vem da conservação, 21% do reflorestamento, 14% da agropecuária, 1% do manejo de florestas naturais e 1% na conservação de áreas úmidas. A COP26 vai trazer impulso e perspectivas de financiamento para essas soluções, mas é preciso implementá-las com celeridade, ao longo desta década. 

O CEBDS acredita que essas oportunidades se alinham com as metas e métricas do Marco Global da Biodiversidade Pós 2020, que também acompanhamos. O setor empresarial brasileiro defende o fim do desmatamento ilegal como passo fundamental para o combate às mudanças climáticas e cumprimento da meta brasileira no pós-COP26. Nossas empresas sabem produzir e conservar ao mesmo tempo, e agora é o momento de fomentar, mais do que nunca, linhas de financiamento para projetos que mantenham a floresta em pé e que privilegiam a agricultura sustentável, a conservação e restauração florestal e o apoio às comunidades locais. Conservar e regenerar nossa biodiversidade nos levará a dar uma contribuição significativa para o combate à emergência climática, além de gerar prosperidade sustentável e inclusão social.

Por Marina Grossi

Artigo originalmente publicado no Estadão

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